Débora Fogliatto
Em outubro de 1980, mulheres começaram a se reunir nas escadarias do Teatro Municipal de São Paulo para protestar contra os crimes que sofriam em todo o país. Suas manifestações instituíram o dia 10 de outubro como Dia Nacional de Luta contra a Violência à Mulher. Mais de 30 anos depois, o Brasil já tem legislação específica sobre esses casos e conta com uma central de atendimento específica, o Disque 180, que de janeiro a junho de 2014 recebeu aproximadamente 16 mil denúncias de violência contra a mulher, que foram encaminhadas aos sistemas de justiça e segurança pública dos estados.
Mas mesmo com os avanços, os números continuam assustadores: segundo estudo preliminar do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), entre 2009 e 2011 o Brasil registrou 16,9 mil feminicídios (mortes de mulheres por conflito de gênero), a maior parte deles casos de agressão perpetrada por parceiros íntimos. Esse número indica uma taxa de 5,8 casos para cada grupo de 100 mil mulheres.
Em 2011, o estudo “Femicídio: um tema para debate” mostrou que o marido ou companheiro foi identificado como agressor em 50,4% dos casos de homicídios. Ex-maridos ou ex-companheiros eram responsáveis por 25,5% das agressões fatais. Entre cada dez mulheres assassinadas, seis tinham filhos. A maioria dos femicídios (83,48%) ocorreram na casa da vítima e em 41,7% dos casos já havia registro de outras agressões, de onde se conclui que a morte de mulheres por seus maridos e companheiros é um crime anunciado.
No Rio Grande do Sul, os índices do primeiro semestre de 2014 de mortes de mulheres foram reduzidos em 32,7% em relação ao mesmo período do ano anterior. O levantamento foi feito em conjunto pela Secretaria de Segurança Pública e a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), instituída pela atual gestão, que atua no combate à violência através da Rede Lilás. Pelo Telefone Lilás (0800 541 0803) e o Centro Estadual de Referência da Mulher “Vânia Araújo Machado” (CRMVAM), desde 2011 mais de 7 mil mulheres que estavam em situação de violência foram acolhidas pela equipe de psicólogas, advogadas e assistentes sociais da Rede.
No final de agosto, a Rede Lilás agregou também o Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS), com o objetivo “de atuar no aperfeiçoamento das ações de prevenção e de proteção às mulheres, em sintonia com os princípios constitucionais”, de acordo com nota enviada pelo Tribunal.
A secretária da SPM-RS, Ariane Leitão, contou que a parceria surgiu de uma iniciativa das servidoras do TCE, que a levaram ao presidente Cézar Miola e ao conselheiro Estilac Xavier. “É muito significativo ter essa parceria com TCE, que tem tanta credibilidade, participando das reuniões e articulando ações em conjunto, especialmente sendo fiscalizadores”, disse, colocando que a parceria ainda está sendo estudada em termos práticos, pois “é uma nova iniciativa, que não conhecemos em nenhum outro estado brasileiro”.
A ideia da secretaria, que existe há três anos, é “estabelecer uma política que se fortaleça cada vez mais do ponto de vista da emancipação das mulheres”, segundo Ariane. Ela lembra que, por existir há pouco tempo, a SPM-RS ainda está avançando. “Temos o observatório específico de segurança das mulheres e a ideia é poder avançar para observatório de política para as mulheres. Não trabalhamos só com a violência, embora obviamente seja uma das prioridades”, ponderou Ariane.
Rede Lilás e Patrulha Maria da Penha
A implantação da Lei Maria da Penha no RS é feita por meio da Rede Lilás, que coordena ações com a participação de instituições de acesso à segurança, à saúde, à educação, à assistência social. As ações acontecem a partir de Coordenadorias, Centros de Referência, Casas-abrigo e da Patrulha Maria da Penha, que atua fiscalizando o cumprimento da medida protetiva de urgência quando solicitada pelas vítimas de violência doméstica, fazendo visitas regulares à casa da vítima e prestando atendimento no pós-delito. Se necessário, também a encaminha para uma casa-abrigo e monitora o agressor.
Há dois anos, o estado implantou a Patrulha Maria da Penha, braço da Brigada Militar que atua na proteção de mulheres que sofreram violência doméstica. Em agosto, Santana do Livramento foi a 16ª cidade do estado a receber o serviço, que também abrange Alvorada, Cachoeirinha, Canoas, Caxias do Sul, Charqueadas, Cruz Alta, Esteio, Novo Hamburgo, Passo Fundo, Pelotas, Porto Alegre (seis Patrulhas), Santa Cruz do Sul, Uruguaiana e Vacaria.
No estado, são ainda 24 centros de referência em 23 municípios, dos quais três estão em fase de instalação até o final de 2014, e 19 Delegacias Especializadas no Atendimento às Mulheres.