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11 de setembro de 2014
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21:42

Seminário na Câmara de Vereadores debate violência contra a população LGBT

Por
Sul 21
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Violência contra a população LGBT foi debatida por militantes, vereadores e autoridades policiais l
Violência contra a população LGBT foi debatida por militantes, vereadores e autoridades policiais l

Caio Venâncio

Na manhã desta quinta-feira (11), a Câmara de Vereadores de Porto Alegre, por meio da Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh), promoveu  seminário sobre violência contra a população LGBT. Poucas horas após o incêndio criminoso no Centro de Tradições Gaúchas (CTG) de Santana do Livramento, que iria sediar casamentos coletivos, entre eles de um casal de lésbicas, a discussão envolvendo vereadores, militantes da causa e autoridades, tornou-se ainda mais pertinente. O objetivo da atividade foi o de coletar dados e informações para o programa “Mapa da Segurança Pública em Porto Alegre”, que será lançado em dezembro.

Abrindo as falas, o vereador Mário Fraga (PDT) reforçou a importância de avançar nesta discussão num momento como este. “O incêndio no CTG foi algo lamentável, mas ao menos incentivará o debate sobre esta causa”, acredita. Fernanda Melchionna (PSOL) definiu o tema como “pauta civilizatória”. “Hoje, convivemos com uma bancada fundamentalista que é refratária à conquista de direitos por parte dos homossexuais, mas é preciso ir além, pois o que não avança retrocede. Intolerantes não passarão”, defendeu.

Presidente da comissão, Alberto Kopittke (PT) afirmou que é necessária uma revisão de paradigma no relacionamento entre as forças policiais e os homossexuais. “Em Nova York, por exemplo, a polícia possui um bloco uniformizado na parada livre e procura gays para integrarem a corporação em bares frequentados por este público”, cita.

Representando a Secretaria de Segurança Pública do estado (SSP), a delegada Patrícia Sanchotene divulgou a carteira de nome social para travestis e transexuais, implementada pelo governo em 2012, uma iniciativa pioneira no país. O documento, cuja emissão da primeira via é gratuita, pode ser feito em postos do Instituto Geral de Perícias (IGP) e tem validade para tratamento nominal nos órgãos do Poder Executivo do RS.

Enfatizando a impossibilidade de que os agentes de segurança pública carreguem consigo qualquer tipo de preconceito, Dagoberto Albuquerque, major da Brigada Militar (BM) e vice-diretor do Presídio Central de Porto Alegre, relatou a experiência da criação de uma galeria exclusiva para os detentos LGBT. “Recebemos um troféu em função disso. É um marco, é um novo momento na relação com a BM.”, definiu o professor de sociologia do curso de formação de oficiais. Nas aulas, Albuquerque estimula a aplicação dos conceitos no dia-a-dia dos brigadianos, incentivando a mediação dos conflitos.

Secretária adjunta da livre orientação sexual de Porto Alegre, Glorya Cristas admitiu que a criação deste órgão governamental se deve à pressão dos ativistas da causa gay. Com o objetivo de construir políticas ao lado dos movimentos sociais, ela conta que é difícil levantar dados sobre o tema. “As pessoas não dão queixa dos casos de homofobia, começa por aí. Eu mesma fui agredida em plena Rua dos Andradas, quando ia para a secretaria”, relata. Depois, Glorya completou: “Não quero generalizar, porém em muitos casos as pessoas não vão à delegacia porque são hostilizadas por lá”, alertou.

Num segundo momento da discussão, as autoridades foram substituídas na mesa por militantes LGBT. Bernardo Amorim, integrante do coletivo Somos, foi mais um a relatar as dificuldades de identificar nas estatísticas o que é exatamente a violência contra os homossexuais. Falando sobre a legislação diminuta que protege os gays, ele lembrou da existência, em Porto Alegre, do artigo 150 da Lei Orgânica do município, que prevê a possibilidade de cassação do alvará de estabelecimentos comerciais que pratiquem condutas preconceituosas. “É um avanço, mas o município não leva à prática. Eu nunca vi nenhum local ser fechado”, conta.

Pela Organização Não-Governamental (ONG) Nuances, Célio Golin frisou a importância de o movimento gay ter um posicionamento político consistente: não cair no “denuncismo que não nos faz avançar” e não se preocupar apenas com o preconceito do qual são vítimas. “Não somos apenas homossexuais. Há outras interfaces: somos homens, mulheres, brancos, negros, pobres, ricos. Os LGBTs também reproduzem preconceitos. Às vezes, a bicha rica não se importa com a bicha pobre porque o preconceito não incide da mesma forma. Falta reflexão política”, criticou.

Militante do PT, Golin analisa que, atualmente, o governo é refém do fundamentalismo religioso, o que prejudica e compromete o programa proposto. “No Nuances, há mais de 15 anos já sabíamos a constatação de que este conservadorismo iria nos complicar. De início, eram setores de Direita da Igreja Católica, agora são os evangélicos”, contextualiza.

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No Brasil, 133 travestis foram assassinados em 2013. No RS, foram 13 casos. Partindo desses dados, Marcelly Malta, da ONG Igualdade, contou a experiência de ter desenvolvido junto com a Brigada Militar uma cartilha de ética profissional para travestis que se prostituem no bairro São Geraldo. “Uns dez anos atrás, tínhamos problemas com a BM, agora sentamos e conversamos. Com esse material, disciplinamos alguns aspectos, como por exemplo os casos de travestis que trabalhavam vestindo apenas calcinha”, indica. Em setembro, quando os gaúchos comemoram o aniversário da Revolução Farroupilha (1835-1845), Marcelly, uma travesti, revela que, nas vezes em que tentou passear no Acampamento Farroupilha, sofreu com o preconceito. “Tomei ovada e tive que sair escoltada. Algumas pessoas disseram pra mim que o nosso dia era na parada gay”, conta.

Roberto Seitenfus e Lucas Maróstica, dos coletivos Desobedeça e Juntos Pelo Direito de Amar, respectivamente, voltaram a falar no artigo 150 da Lei Orgânica do município, alegando que já foram feitas denúncias de práticas homofóbicas em estabelecimentos comercias, sem que tenham sido tomadas providências.

Encerradas as intervenções, os vereadores debateram propostas de criação de uma delegacia da diversidade sexual e de discussão da homofobia no Acampamento Farroupilha. Também foi ponderado a possibilidade de o preconceito contra gays ser uma das causas de evasão escolar.

Também estiveram presentes as vereadoras Séfora Motta (PRB) e Mônica Leal (PP),  e Leonardo Vaz, presidente da Comissão Especial de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS).


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