Opinião
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2 de setembro de 2022
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16:29

O Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre é persistente, resiliente e resistente (por CMS)

Foto: Luiza Castro/Sul21
Foto: Luiza Castro/Sul21

Conselho Municipal de Saúde (*)

O Conselho Municipal de Saúde (CMS/POA), órgão permanente, fiscalizatório e deliberativo do SUS amparado pela Norma Constitucional, com atribuições reguladas pelas leis federais nº 8.080 e 8.142 de 1990, pela resolução nº 453 de 2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), e, no âmbito municipal, pela lei complementar nº 277 de 1992, vem a público manifestar-se quanto ao projeto de lei complementar (PLC) N° 026/21 do Executivo Municipal, votado de forma intempestiva pela Câmara Municipal de Porto Alegre (CMPA), em 17 de agosto deste ano, e aprovado pela base aliada do governo Sebastião Melo no legislativo.

O PLC 026/21 propõe a revogação da lei complementar 277/92, que criou formalmente o CMS/POA no Município, e impõe de forma autoritária novo regramento. Foi protocolado na Câmara de Vereadores pelo poder executivo sem haver discussão com o CMS. O Colegiado do CMS é composto por representantes de entidades dos segmentos usuárias/os, trabalhadoras/es e governo, além das representação das/os usuárias/os e trabalhadoras/es via Distritos de Saúde.

A Lei aprovada reduz o número de representantes de usuárias/os de 2 titulares para 1 titular e retira a representação de trabalhadoras/es dos territórios reduzindo para 4 representantes indicados pelas Coordenadorias de Saúde. Ou seja, diminui o número de conselheiras e conselheiros e aumenta de forma não proporcional o número de conselheiras/os da gestão, desmembrando o segmento gestor/prestador de serviço e criando novo segmento para cada um deles, ferindo, assim, a proporcionalidade constitucional, regulamentada pelas Resoluções do CNS, que é 50% de usuárias/os, 25% de trabalhadoras/es, e 25% gestor/prestador de serviço. Além disso, traz modificações graves ao caráter do CMS, atribuindo-lhe caráter consultivo, diferente do que está preconizado na Lei Federal.

Em razão do conteúdo desse projeto, o plenário do CMS, em 11/11/2021, o reprovou e uma série de ações foram realizadas para debater democraticamente e enfrentar tal situação. Foi protocolado na Câmara o Projeto Substitutivo nº 01 ao PLCE 026/21 resgatando o PL 016/2016, produto de amplo debate democrático desse órgão conjuntamente com o Conselho Estadual de Saúde, que apresenta modificações necessárias para readequação do plenário, conforme Resolução do CNS, o qual foi encaminhado em 2016 à Câmara de Vereadores pelo prefeito Fortunati com a mediação do então vice-prefeito Sebastião Melo, mas acabou não sendo votado.

A partir disso, o CMS recebeu apoio de abaixo-assinado da Saúde Coletiva da UFRGS, Moção de Repúdio contra o Ataque ao CMS/POA do Encontro Nacional das Residências em Saúde, desde a Bahia. Realizou Manifesto às Vereadoras e Vereadores de Porto Alegre, demonstrando as diferenças entres o dois projetos apresentados à Câmara de Vereadores, bem como o Pressione.com, com 1262 assinaturas a favor do Projeto Substitutivo do CMS; duas audiências públicas, uma sobre o PLCE 026/21 e outra do Projeto Substitutivo, ambas com a forte presença de usuárias/os, trabalhadoras/es e entidades e uma ausência marcante de vereadores da base governista, para o amplo debate e o real entendimento do que significa o controle social e o SUS.

Além disso, o prefeito Melo designou que os seus secretários pudessem discutir com seus respectivos conselhos de direitos pontos que pudessem convergir para alguma alteração do seu projeto apresentado, onde o Colegiado realizou o esforço de encontro para tentativas de diálogo que não foram frutíferas.

Apesar de todos os movimentos realizados, num estratégico descompasso entre os poderes executivo e legislativo, tivemos a aprovação do Projeto de Lei do Governo Melo, num momento de grande manifestação popular contrária a esta posição do governo e realizamos um dos maiores atos de resistência deste ano na Câmara.

O CMS/POA, que completou 30 anos em maio deste ano, mas com raízes fortalecidas já desde antes de 1992 na capital, tem um histórico de lutas e enfrentamentos que demonstram as entrelinhas que levaram o governo do prefeito Melo a investir contra o controle social do SUS em Porto Alegre. Há o reconhecimento público na área da saúde da cidade quanto à efetividade e a qualidade da atuação do Conselho que se deve à composição e compromisso das conselheiras e conselheiros que defendem e fiscalizam, intransigentemente, a aplicação adequada dos recursos do SUS, conforme regra a lei federal complementar nº 141 de 2012.

Registra-se aqui o caso do Instituto Sollus, que administrava o Programa de Saúde da Família na Capital, entre os anos 2007 a 2009. Por denúncia do CMS foi deflagrada, pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal, a operação Pathos, que desvendou, segundo notícia da época, “uma quadrilha atuando dentro da Secretaria Municipal de Saúde” que desviou R$ 11,4 milhões de recursos do SUS. Isso incomoda e atrapalha um governo autoritário mascarado pelo lema do “Homem do Diálogo”, mas que tem dificuldades para escutar as vozes do controle social.

O CMS/POA tem sido desrespeitado e atacado nas duas últimas gestões municipais. Os pareceres, as resoluções e notas públicas, frutos das construções coletivas e expertises, nunca, ou quase nunca, são utilizados, cumpridos ou, sequer, aproveitados pela gestão. O gestor despreza o trabalho do Colegiado utilizando-se da narrativa protetiva “do diálogo”, mas não faz um diálogo efetivo. O prefeito nunca atendeu aos pedidos de agenda do Conselho e o secretário de saúde Mauro Sparta nunca esteve presente numa reunião do plenário do Conselho de Saúde de Porto Alegre. Ao não respeitar o Conselho de Saúde, o governo descumpre as leis, obstruindo as atribuições legais e cerceia a participação social e a representação da sociedade garantida através do Plenário.

Porém, o Conselho de Saúde tem amparo em legislações e regulamentações federais, e como órgão que fiscaliza as políticas e ações do gestor do SUS municipal, a discricionariedade do gestor não pode ser confundida com o cumprimento da vontade dos gestores, ao contrário, os gestores têm o dever legal de nortear seus atos e decisões pelo interesse público e pelos princípios da administração pública. Isto é, o gestor municipal não tem legitimidade para violar o princípio constitucional da participação da comunidade no SUS regulamentado por leis federais e regrado por normativas também federais que regulamentam os conselhos de saúde em todo o país.

Desta forma, o CMS segue cumprindo seu papel e enfrentando ataques como sempre fez de forma diligente e comprometida com o interesse público, os princípios do SUS e as necessidades em saúde da população. O colegiado tem as raízes da reforma sanitária, da luta contra a ditadura e pela democracia, o que não é pouco e nem frágil. Suas bases consolidaram a máxima de que não existe Saúde sem Democracia, assim como não existe SUS sem participação e controle social. Portanto, todas as medidas cabíveis, administrativas, legais e políticas, sinérgicas e integradas, estão em andamento pelo Conselho de Saúde de Porto Alegre, em conjunto com o Conselho Estadual de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul (CES/RS) e com o Conselho Nacional de Saúde (CNS), para derrubar tal ato antidemocrático que tem como objetivo principal esvaziar e fragilizar a ação do Conselho Municipal de Saúde. O CMS é resiliente, persistente e resistente, enquanto o SUS existir, o controle social do SUS da capital gaúcha também existirá!

(*) Documento aprovado pelo plenário do CMS/POA de 1º de setembro de 2022

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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