Opinião
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6 de março de 2021
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11:02

Todo dia uma luta! Todo dia uma esperança! (por Silvana Conti)

Por
Sul 21
sul21@sul21.com.br
Os Comitês Populares contra a Fome estão se espalhando pelo País.
(Foto: Maiara Rauber/MST)
Os Comitês Populares contra a Fome estão se espalhando pelo País. (Foto: Maiara Rauber/MST)

Silvana Conti (*)

Vivemos um período ultraliberal, conservador, onde o negacionismo e a necropolítica dão o tom do projeto nefasto de Bolsonaro. O presidente genocida corta recursos públicos para áreas como saúde e educação, aposta na venda do patrimônio público, ataca os direitos da classe trabalhadora, fomenta “sabotagens para retardar ou mesmo frustrar o processo de vacinação.

O presidente atenta contra a saúde e a vida dos brasileiros e brasileiras, aposta no caos, está de costas para as mulheres e homens do nosso país.

Somos aquelas que choram as mais de 250 mil mortes porque nossas filhas, netas, irmãs, companheiras, companheiros, parentes, amigas e amigos estão tombando todos os dias sem ter chance de sobreviver.

Somos aquelas que sofrem, gritam, lutam, matam um leão por dia porque nossos filhos, jovens negros da periferia estão na mira da “bala perdida” de um Estado repressor e racista. Nossos filhos são assassinados pela cor de sua pele, sempre acusados, desde a escravatura.

Somos 38 milhões de pessoas no Brasil abaixo da linha da pobreza; dessas, pelo menos 27,2 milhões são mulheres (IBGE);

O Feminismo Emancipacionista Popular com viés Antirracista, é sobre nós, é falar da vida real, das mulheres comuns que fazem o corre cotidiano com TODO DIA UMA LUTA, TODO DIA UMA ESPERANÇA!

Existe um abismo social entre homens e mulheres, entre brancos e negros e as mulheres negras e não negras. Segundo dados do IBGE, 41% de todas as mulheres ocupadas no Brasil estão no setor informal; considerando somente trabalhadoras negras e pardas, a taxa de informalidade sobe para 47,8%;

Mais de 92% dos trabalhadores domésticos são mulheres; 70% delas não têm carteira assinada (IBGE);

Enquanto mulheres realizam 21,7 horas semanais de trabalho não remunerado, os homens desempenham apenas 11 horas na semana​ (IBGE);

31,8 milhões de famílias do país (45,3% do total) são chefiadas por mulheres (Ipea);

Importante destacarmos as(os) profissionais da saúde que estão na linha de frente de maneira incansável na pandemia. E afirmar que são as mulheres 85% das enfermeiras, técnicas e auxiliares de enfermagem no Brasil que estão salvando vidas.

45,6% dos médicos no país são mulheres, o equivalente a 223,6 mil mulheres (Dados Cofen);

Antes da Covid-19, mulheres desempenhavam três vezes mais trabalhos não remunerados do que os homens; com o isolamento, a estimativa é que este número triplique.

Sempre lutamos, e agora seguimos resistindo e lutando pela vida no Brasil. Estamos na linha frente como profissionais da saúde, da assistência social, como rodoviárias, comerciárias, metalúrgicas, servidoras públicas, como trabalhadoras terceirizadas, negras e não negras, mulheres LBTs, desempregadas, com deficiência, que estudam, sonham, criam as crianças, cuidam da casa, são chefas de família, que tem seus direitos retirados, com o respeito ignorado e a democracia usurpada.

O Feminismo Emancipacionista Popular com viés Antirracista, é sobre nós, é falar da vida real, das mulheres comuns que fazem o corre cotidiano com TODO DIA UMA LUTA, TODO DIA UMA ESPERANÇA!

As desigualdades sociais estão escancaradas, vivemos em meio à esta crise sanitária, política, institucional e civilizatória, em que o acirramento da luta de classes se apresenta na fase mais aguda da crise estrutural do capitalismo, tendo a barbárie, o racismo estrutural e a violência institucional como regra na organização do Estado.

Somos nós mulheres e de forma mais cruel as companheiras negras quem mais sofrem na pele com toda esta situação tenebrosa que vivemos, onde somos nós mulheres que levantamos mais cedo e dormimos mais tarde todos os dias, temos tripla jornada de trabalho. Somos aquelas que sofremos múltiplas violências, tanto no âmbito privado, quanto nos espaços públicos.

É muito importante destacarmos que o Estado, o capitalismo e o racismo estão estruturalmente relacionados. As formas sociais de mercado, propriedade privada, dinheiro, finanças, liberdade e igualdade são moldadas para garantir o controle da sociedade nas mãos do grupo dominante.

As mulheres negras foram sempre relegadas a postos subalternos, tratadas como seres humanos inferiores e, geralmente, representadas por sua sexualidade, sendo objetificadas, portanto vistas como mercadorias.

De acordo com Sueli Carneiro (2019, p. 56), “A mulher negra não participa do processo produtivo em igualdade de condições com homens brancos, negros, amarelos, e mulheres brancas e amarelas”. Situa-se, assim, na base da hierarquia social; por esse motivo penalizada tanto em relação a oportunidades, quanto à mobilidade na estrutura ocupacional.

O patriarcado, o colonialismo, o racismo e o sexismo constituíram formas de dominação que caracterizaram o período de escravização e que, no que pese apresentarem dinâmicas diferentes em cada contexto nacional, influenciaram a formação dos aspectos da vida social, própria malha de poder, o que irá criar implicações distintivas em cada contexto social.

Na obra, “A mulher na sociedade de classes” Saffioti (2013), aponta que a sociedade não comporta uma única contradição. Há três fundamentais, que devem ser consideradas: a de gênero, a de raça/etnia e a de classe. Com efeito, ao longo da história do patriarcado, este foi se fundindo com o racismo e, posteriormente, com o capitalismo, regime no qual desabrocharam, na sua plenitude, as classes sociais.

Na sociabilidade capitalista, o seu ato ontológico fundante é a compra e venda da força de trabalho. Consequentemente, a emancipação humana é a superação do trabalho alienado engendrado pela sociedade de classes.

Como se trata de uma totalidade social, a emancipação não pode ser apenas econômica ou política, mas também precisa ser total. Enfim, a emancipação humana é uma necessidade tão nítida nesses tempos de domínio global do capital, domínio gerenciado pelo Estado.

Consequentemente, a emancipação das mulheres e de toda a sociedade, é a superação do trabalho alienado engendrado pela sociedade de classes. Enfim, a emancipação é uma necessidade tão nítida nesses tempos de domínio global do capital, domínio gerenciado pelo Estado.

O objetivo da emancipação das mulheres não pode ser somente um compromisso subjetivo, um desejo ou um sonho utópico. Com efeito, precisa ser resultante de uma crítica radical da sociedade e da natureza, incluindo, nessa crítica, as tentativas de emancipação já vividas no processo histórico.

Para Collins (2019) uma das dimensões da opressão de mulheres negras é a forma específica com que o trabalho dessas mulheres será historicamente explorado para a construção e manutenção do capitalismo.

O racismo faz parte da história moderna guardando relação com a formação do Estado. Segundo Silvio Almeida, o conceito de raça foi desenvolvido pelo modelo do Estado burguês para eleger o sujeito universal e organizar as relações políticas, econômicas e jurídicas a partir da categorização em classes dos indivíduos com o fim de preservar o grupo hegemônico.

Após a abolição da escravatura, não houve mudanças significativas, já que não foram criados mecanismos ou políticas públicas que buscassem a igualdade de direitos e oportunidades para as negras e negros, que supostamente, passaram a ser “livres”.

Para Saffioti (2013), as questões das mulheres não é algo isolado da sociedade, e superar a opressão feminina só será possível com a destruição do regime capitalista e a implantação do socialismo. Na obra, “A mulher na sociedade de classes” (2013), a autora aponta que a sociedade não comporta uma única contradição.

Há três fundamentais, que devem ser consideradas: a de gênero, a de raça/etnia e a de classe. Com efeito, ao longo da história do patriarcado, este foi se fundindo com o racismo e, posteriormente, com o capitalismo, regime no qual desabrocharam, na sua plenitude, as classes sociais

Collins (2019) traz que a interseccionalidade é, ao mesmo tempo, um conceito analítico de “projeto de conhecimento” e um instrumento de luta política, no combate às opressões múltiplas e imbricadas, com vistas à emancipação. É nesse sentido que essa autora considera a interseccionalidade ao mesmo tempo um “projeto de conhecimento” e uma arma política. Ela diz respeito às “condições sociais de produção de conhecimentos” e à questão da justiça social.

Finalizo lançando alguns desafios para construirmos juntas o feminismo emancipacionista popular!

Precisamos contribuir juntas e juntos uma ampla unidade entre governos, sociedade civil e partidos políticos.

Precisamos defender a vacinação para todas, todos e todes e o protocolo sanitário celebrado globalmente, bem como a renda emergencial para famílias em situação de vulnerabilidade financeira.

Precisamos manter os pés no chão, a cabeça nas estrelas, a espinha ereta, e seguir resistindo e lutando por todas nós.

Tendo como lema: TODO O DIA UMA LUTA, TODO O DIA UMA ESPERANÇA.

 Referências

CARNEIRO, Sueli. Escritos de Uma Vida. São Paulo: Pólen, 2019.

COLLINS, Patrícia Hill. Pensamento Feminista Negro: conhecimento, consciência e a política do empoderamento. Tradução Jamille Pinheiro Dias. São Paulo: Boitempo, 2019.

HIRATA, Helena. Nova Divisão sexual do trabalho? São Paulo. Boitempo, 2002.

MARX, Karl. A origem do capital: a acumulação primitiva. São Paulo: Ed. Global, 1989.

SAFFIOTI, Heleieth I. B. A Mulher na Sociedade de Classes: Mito e Realidade. 3. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2013.

(*) Vice-presidenta da CTB/RS. Direção Nacional da UBM. Membro do Fórum Nacional permanente sobre a emancipação da mulher. Mestranda em Políticas Sociais UFRGS/RS.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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