Opinião
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1 de novembro de 2018
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13:11

O lugar da autocrítica (por Rodrigo Dilelio e Márcio Medeiros Félix)

Por
Sul 21
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O lugar da autocrítica (por Rodrigo Dilelio e Márcio Medeiros Félix)
O lugar da autocrítica (por Rodrigo Dilelio e Márcio Medeiros Félix)
Foto: Marco Weissheimer/Sul21

Rodrigo Dilelio e Márcio Medeiros Félix  (*)

Muito se fala sobre uma necessária “autocrítica do PT”. Aqueles que iniciam o seu balanço político do período recente com base nessa argumentação, costumam alegar que a ausência da autocrítica do partido teria levado ao seu desgaste e ao quadro de derrota perante o fenômeno do bolsonarismo.

O PT foi fundado em 1980, a partir de uma confluência de movimentos de luta contra a ditadura. Partido político claramente de esquerda, colocou-se como alternativa tanto ao getulismo (que se reorganizaria no PDT liderado por Brizola) quanto em relação aos regimes socialistas do Leste Europeu, que tombariam ao final daquela década de 1980. Em 38 anos de história, o PT colaborou na construção da nossa complexa e ainda frágil democracia. Nos seus governos, promoveu políticas que mudaram a realidade de milhões de brasileiros, em especial nos 13 anos em que esteve à frente do Governo Federal.

Em sua história até aqui, o Partido, seja por meio de suas decisões coletivas, seja por atos de seus quadros públicos, cometeu erros. Não há dúvidas da necessidade do PT (e de toda a esquerda brasileira, aliás) produzir balanços claros, sinceros e lúcidos sobre toda essa experiência vivida. Será fundamental inclusive para dar força à resistência do povo brasileiro ao Governo Bolsonaro, que deve ser um dos mais repressivos e regressivos da nossa história.

Compreender os erros e acertos do passado recente é fundamental também para retomar os debates históricos da esquerda brasileira sobre um projeto nacional, enriquecidos pelas experiências recentes.

Nesse contexto, o PT e a esquerda se examinarem é parte do necessário processo que vai construir o futuro. No entanto, quando se cobra a “autocrítica do PT” como se isso fosse o único fato necessário para o Brasil melhorar, evidente que se trata de uma tática (até certo ponto legítima) da disputa interna no campo progressista. Não nos parece razoável, entretanto, que se promova uma espécie de terceiro turno dentro do campo oposicionista. Não à toa, muitos dos que a exigem falam em formar frente sem o PT, como se fosse possível falar em projeto democrático e popular no Brasil sem dialogar com o partido que elegeu a maior bancada na Câmara Federal e o maior número de governadores, mesmo num momento de enormes dificuldades e diante de uma brutal ofensiva conservadora.

É preciso muita lucidez para enfrentar o próximo período. Antes de mais nada, é preciso compromisso com o povo brasileiro e com a consolidação da nossa ainda jovem democracia. Não será priorizando a disputa dentro do campo que derrotaremos os projetos antipopulares de Bolsonaro. Nem será banindo ou isolando o PT que a esquerda brasileira resolverá seus problemas. Pelo contrário: a manutenção e o amadurecimento da nossa democracia passa pela força das organizações do povo (que sofrerão grandes e anunciados ataques por parte de Bolsonaro) e dos seus partidos.

A história das democracias é a história de seus partidos políticos, com seus erros e acertos. Embora a social-democracia alemã tenha cometido erros que contribuíram para o ascenso de Hitler, o SPD se reergueu e cumpriu um papel fundamental para a reconstrução daquele país, sendo uma força política importante até hoje. Democratas e Republicanos já foram responsáveis por grandes dramas na história dos EUA, sendo que os últimos tiveram Nixon, obrigado a renunciar diante de um escândalo histórico. A direita gaullista francesa tem sofrido com o desgaste de sucessivos governos envolvidos em corrupção. Nem por isso se cogita cassar o registro desses partidos. No caso francês, boa parte do seu eleitorado foi capturado por alternativas à direita, livres do desgaste.

Os erros e acertos de um partido e de lideranças políticas são julgados pelo povo num regime democrático. Levam a derrotas eleitorais, em alguns casos fazem surgir alternativas. É da essência da democracia que partidos e lideranças vençam e percam eleições, e que ciclos históricos sejam cumpridos. Cabe à esquerda debater com o povo brasileiro e lutar para que o ciclo de ofensiva da extrema-direita dure o menor tempo possível. O PT fará parte desse processo, independentemente de seu maior ou menor protagonismo. E será nessa caminhada que certamente demonstrará que aprendeu com seus erros, para que possa voltar a produzir o maior dos seus acertos: mudar pra melhor a vida do povo brasileiro.

(*) Rodrigo Dilelio é sociólogo e presidente do PT Porto Alegre. Márcio Medeiros Félix é advogado.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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