Opinião
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21 de agosto de 2018
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14:15

A polarização nacional e a disputa ao governo gaúcho (por Erick Kayser)

Por
Sul 21
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A polarização nacional e a disputa ao governo gaúcho (por Erick Kayser)
A polarização nacional e a disputa ao governo gaúcho (por Erick Kayser)
Candidatos ao governo do Estado: Júlio Flores (PSTU), Roberto Robaina (PSOL), Paulo de Oliveira Medeiros (PCO), Mateus Bandeira (Novo), Eduardo Leite (PSDB), Miguel Rossetto (PT), Jairo Jorge (PDT) e José Ivo Sartori (MDB).

Erick Kayser (*)

Sobram motivos para definir estas eleições de 2018 como atípicas e fora de toda a suposta normalidade democrática estabelecida no Brasil desde a Constituição de 1988. Não por acaso, no pleito ao principal posto político do país, as pesquisam apontam para dois símbolos da nossa atual anormalidade: de um lado, Lula, o candidato líder em qualquer cenário, encontra-se encarcerado e tendo seu direito a manter-se candidato ameaçado. Noutro, seu principal adversário, Bolsonaro, com um extremismo político de tipo protofascista, possibilita a paradoxa situação de, pelo sufrágio, o povo legitimar que a democracia seja destroçada por um candidato a ditador bufão. Por razões óbvias, o centro das atenções da maioria das pessoas estão voltadas para a disputa presidencial. As disputas aos governos estaduais acabam ficando secundarizadas para a maioria dos eleitores, para não mencionar a já histórica indiferença generalizada para os cargos legislativos.

No Rio Grande do Sul não é diferente. Num cenário de crise política e econômica, onde a indiferença e o desencanto atingem parcelas expressivas do eleitorado, não espanta que na última pesquisa divulgada pelo Ibope (17/08) para o governo estadual, na espontânea, 63% disseram não saber em quem votar e outros 20% que não votarão em ninguém. O atual governador, José Ivo Sartori do MDB, ostenta índices de rejeição e desaprovação a seu governo que desestimulariam apostar em sua reeleição. No entanto, esta mesma pesquisa, a exemplo de outros institutos, apontam o atual governador na dianteira para a disputa. Pode-se argumentar, com certa razão, que a campanha eleitoral recém começou e que medida que os nomes da oposição tornarem-se mais conhecidos da população – hoje os melhores colocados são Miguel Rossetto (PT) e Jairo Jorge (PDT) – e, explorando a rejeição de Sartori, ganhariam competitividade. Esta parece ser também a aposta de Eduardo Leite (PSDB), candidatura dissidente do atual governo, que partindo de uma avaliação que Sartori não conseguirá se reeleger, busca garantir a continuidade das atuais políticas neoliberais conduzidas no Palácio Piratini.

Mas, será que em um cenário atípico, como o deste ano, é seguro apostar que a rejeição de Sartori, e portanto, um balanço impopular de seu governo e da maneira como o executivo estadual tem desempenhado seu papel, será o determinante? Sem dúvida será um fator importante, mas convém observar com atenção os impactos que a disputa nacional terá no pleito regional.

Se a vitória de Tarso Genro para governador em 2010, em parte, se explica pela desaprovação popular ao governo da tucana Yeda Crusius, a não reeleição do petista não se deu pelo mesmo motivo. Mesmo tendo um governo sem grandes símbolos políticos, Tarso gozava de bons índices de aceitação e uma baixa rejeição ao seu governo. Prova disso é que seu partido ampliou a presença na Assembleia Legislativa, tendo o PT passado para 14 cadeiras, quando quase todas as demais grandes legendas reduziram seu tamanho, num cenário de grande dispersão de votos. Entendo que a polarização nacional entre a Dilma e o Aécio teve uma influência decisiva na disputa local, garantindo a vitória de Sartori do PMDB.

Mesmo Dilma tendo ganho no 1º turno no RS, atingindo 43% (índice superior ao de Tarso, com 32%), no segundo turno, a polarização venho acompanhada do crescimento de uma “onda antipetista”, que garantiu que quase todos os eleitores de Marina Silva (3º colocada) migrassem para Aécio, que chegou a 53% dos votos no estado, enquanto Dilma, com 46%, praticamente repete sua votação do primeiro turno. Para governador, Sartori não só conseguiu colar-se nos eleitores aecistas, como ainda abocanhar uma pequena parte dos votos de Dilma, chegado a 61%. Este descompasso, diriam alguns, deve-se a histórica indisposição dos gaúchos em reeleger seus governadores. Ainda que seja um dado difícil de mensurar, de fato, nenhum governador que disputou eleições democráticas conseguiu se reeleger.

A proximidade do pleito em outubro, deverá, ao longo de setembro, ampliar duas tendências opostas: de um lado, a forçosa necessidade das pessoas escolherem candidaturas para os governos estaduais (e portanto, olharem para seu quintal) e, de outro, o acirramento da disputa nacional que poderá ganhar um tom quase plebiscitário: democracia vs a continuidade (renovada) do golpe ou ainda democracia vs ditadura. A probabilidade das discussões nacionais influenciarem decisivamente o voto a governador este ano é grande mas não exclusiva, sendo da síntese das tensões entre fatores locais e pautas gerais que se decidirá a eleição, ainda que de forma desequilibrada em favor dos temas nacionais.

Salvo surpresas, a tendência é de se repetir a polarização histórica entre esquerda x direita no 2º turno para o governo estadual. Pela direita, Sartori leva vantagem sobre o nome tucano, mas pelo fraco desempenho de seu governo, não seria impossível o ver superado pelo ex-prefeito de Pelotas, ainda que no momento não pareça o mais provável. No outro polo, o fato de Lula aparecer liderando no RS, estado tido como um dos polos do conservadorismo no país, demonstra certa recuperação da força social da esquerda no eleitorado gaúcho. O PT, caso consiga associar Rossetto ao voto lulista, não apenas larga com chances reais de garantir uma vaga no 2º turno, como ainda contaria com a possibilidade factível de vitória. A favor da candidatura Rossetto o fato de Manuela, do PCdoB, indicada a vice de Lula, ser gaúcha, facilitando esta associação. Jairo Jorge, com o fraco desempenho de Ciro Gomes no estado, não contará com este trunfo, além de pesar negtivamente certas ambiguidades em suas posições políticas, dificultando seu posicionamento em um cenário de acirramento político e necessária tomada de posição.

Em um mar de indefinições e incertezas, prognósticos sempre são arriscados, mas movimentos políticos e sociais recentes, associado a tendências históricas, nos permitem alguma segurança na tentativa de observar o cenário e projetar seus possíveis caminhos. Neste esforço, não deixa de ser um tanto irônico constatar que está colocada a possibilidade real das forças políticas que patrocinaram o golpe parlamentar de 2016 serem derrotadas pelo voto. A direita gaúcha, que ocupa um lugar privilegiado no centro do governo Temer, poderá ver encurtado o seu projeto de poder.

(*) Historiador

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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