Opinião
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6 de abril de 2014
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09:34

O cheiro do espírito juvenil (por Murilo Amatneeks)

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O cheiro do espírito juvenil (por Murilo Amatneeks)
O cheiro do espírito juvenil (por Murilo Amatneeks)

Melhor queimar do que apagar aos poucos.

Este trecho da música “My My, Hey Hey” de Neil Young completa, neste 05 de abril, 20 anos da sua citação mais famosa: a carta de suicídio de Kurt Cobain.

Foi com esta frase que o vocalista e guitarrista do Nirvana resumiu a sua conturbada, brilhante, assediada vida que, neste dia, ganhou também o adjetivo “breve”. Aos 27 anos, ele entrou para o ilustre grupo de artistas do rock que morreram com essa idade.

Recordo-me do primeiro contato com a introdução de Smells Like Teen Spirit (em português “cheira a espírito juvenil”, breve alusão a uma marca de desodorante americano). A primeira audição, revolucionária, gerava uma sensação diferente de tudo que você já tinha ouvido. A entrada da bateria seguida da distorção  representava mais do que a melhor virada que você já tinha ouvido. Representava um arremate. Não um arremate que lhe despertaria qualquer consciência social, como uma letra de RAP, mas uma sensação primeira, tão arrebatadora que você não conseguiria explicar – talvez esta a grande virtude do rock and roll.

Surpreendido pela música, você olhava o encarte do disco e pensava: como esses caras podem ser rockeiros, sem roupas com peles, espinhos, rebites, coturnos, maquiagem nos olhos, laquê nos cabelos, bandanas e faixas na cabeça? Não que esta vestimenta dos anos 80 não pudesse ser legal, mas não era assim que eu ia pra escola.

Aí que está. O mais legal dessa banda foi o paradigma que quebrou. Simplesmente, bastava ser você como você era normalmente. No máximo, você deixava o cabelo crescer um pouco – o que já era suficiente pra refletir sobre o conceito de transgressão. Lembro que quis escrever sobre isso na minha redação do vestibular da UFRGS, quando precisava discutir este conceito no livro da Lya Luft, mas achei que isso pudesse me reprovar.

Hoje, após duas décadas, Cobain continua mais atual do que nunca. A raiva adolescente que deu bons lucros, como ironizava na abertura de seu último álbum, não parou de render, a ponto de Cobain ultrapassar Elvis como artista póstumo com maior rendimentos gerados, fato este que seria o suficiente para ele se suicidar novamente, se pudesse.

Esta sua atualidade também se encontra com tudo que falamos sobre juventude, que voltou a ser a palavra da moda. A voz e a guitarra do ícone da chamada geração X, ainda ecoam na tal geração Y, mesmo sendo ele sempre o péssimo exemplo, segundo todos os pais. Esta geração atual também é considerada alienada até que prove o contrário. Ao provar, é com berros, desafinados e agressivos como as suas guitarras, e com bandeiras, tão diferentes entre si e provocadoras como as suas letras.

Se existe um espírito juvenil, ele não se queimou e está longe de se apagar.

Murilo Amatneeks é secretário-executivo do Conselho Nacional de Juventude, e  também tem 27 anos.


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