Opinião
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24 de julho de 2012
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12:00

O homicídio de crianças e jovens no Brasil cresceu 346% — absurdo e descaso

Por
Sul 21
sul21@sul21.com.br

Por Sérgio Botton Barcellos

Um estudo (1) publicizado de forma mais intensa nos últimos dias analisou os últimos 30 anos de violência homicida no Brasil e mostra a profunda mudança nos padrões históricos. Aponta as principais características da evolução dos homicídios em todo o país: nas 27 Unidades Federadas, 27 Capitais, 33 Regiões Metropolitanas e nos 200 municípios com elevados níveis de violência (2).

Crianças e adolescentes na faixa de 0 a 18 anos de idade constituem um contingente de exatas 59.657.339 pessoas, segundo o Censo Demográfico de 2010. Representam 31,3% da população do país. São, pelas definições da lei, 35.623.594 de crianças de 0 a 11 anos de idade – 18,7% do total do país – e 24.033.745 de adolescentes na faixa dos 12 aos 18 anos de idade: 12,6% da população total.

Segundo o relatório, o número de homicídios contra jovens nesse período representou 176.043 de todas as mortes e a situação se agravou na última década, quando foram mortos mais de 84 mil jovens. Entre 1980 e 2010, as taxas cresceram 346%. O Estado mais violento para os jovens, segundo o relatório, é Alagoas, com 34,8 mil homicídios para cada 100 mil crianças e adolescentes. Entre as capitais, Maceió e Vitória apresentam taxas elevadas: 79,8 e 76,8 assassinatos por 100 mil crianças e adolescentes, quase seis vezes acima da média nacional.

Para termos uma idéia do que significa esses dados: a segunda causa individual de morte de crianças e adolescentes: neoplasias – tumores – representam 7,8%; e a terceira, doenças do aparelho respiratório: 6,6%. Isoladamente, homicídios de crianças e adolescentes, que fazem parte das causas externas, foram responsáveis por 22,5% de total de óbitos nessa faixa.

Na contramão das denominadas causas naturais que diminuem de forma contínua e acentuada nas três décadas analisadas, as causas externas evidenciam crescimento, principalmente a partir do ano 2006, inclusive, causadas por homicídios que passam de 0,7% para 11,5 % e nos acidentes de transporte, que passam de 2% para 11,5% do total de mortes na faixa de 1 a 19 anos de idade. Para os jovens, esse aumento ocorreu principalmente por causa do crescimento da venda e uso das motocicletas, que representaram 39% das mortes em acidentes de trânsito, à frente do automóvel (19,3%) e pedestres (12%).

Efetivamente, se acidentes de transporte, suicídios e homicídios de jovens e adolescentes cresceram ao longo do tempo, outros acidentes e outras violências diminuíram. Essa variação de causas conforma os dados das causas externas de homicídio em 2010:

• 43,3% das crianças e jovens são assassinadas;

• 27,2% morrem em acidentes de transporte;

• mais 19,7% em outros acidentes;

• essas 3 causas representam acima de 90% do total de mortes de crianças e adolescentes.

Ressalta-se que dentre os 99 países com dados recentes nas bases estatísticas da Organização Mundial da Saúde, o Brasil, com sua taxa de 13,0 homicídios para cada 100 mil crianças e adolescentes, ocupa a 4ª posição internacional, só superada por El Salvador, Venezuela e Trinidad e Tobago.

Contudo, o Brasil está conseguindo atingir as Metas do Milênio pela rápida redução nas últimas décadas de suas taxas de mortalidade infantil (crianças menores de um ano) e na infância (crianças menores de cinco anos) pelas diversas ações no campo da saúde, da sanidade pública e de acesso a outros benefícios sociais. Contudo, isso não acontece na área dos homicídios que avança.

Cabe destacar que no discurso feito na abertura da 9ª Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, a presidente Dilma Rousseff falou “uma grande nação tem que ser medida por aquilo que faz por suas crianças e adolescentes, e não pelo PIB”. Alterta-se que esse discurso tem que começar a se materializar em ações e políticas públicas efetivas e adequadas emergencialmente. Apesar de ser notória a ocorrência do debate, elaboração de cartilhas e algumas ações, como o Plano Presidente Amigo da Criança e do Adolescente, sobre o tema de Homicídios de jovens no Brasil nas esferas governamentais junto a Secretaria de Direitos Humanos do governo federal e de alguns estados, essas ações configuram-se como inócuas e sem capilaridade junto à sociedade.

Desse modo, quando debatemos a realidade da juventude brasileira e as políticas públicas para esse grupo social apresenta-se mais uma variável social que precisa ser considerada nesse debate, que são os altos índices de homicídio das e dos jovens no Brasil. Além das insuficientes políticas de educação, trabalho e saúde oferecidas por parte do governo, sinaliza-se que a juventude também precisa de políticas públicas em infra-estrutura e de segurança pública apropriadas para o meio rural que criem condições de vida adequadas para as e os jovens, e que não sejam políticas que gerem a ampliação da atual situação de violência contra a criança e a juventude no Brasil (3).

A partir dessa contribuição o objetivo foi apresentar os dados desse importante estudo divulgado, além de expor um ponto de vista sobre esse tema, e alertar para a necessidade desse debate também ser feito no conjunto das discussões dos movimentos e organizações sociais em juventude sobre a atual situação das crianças e jovens no Brasil, bem como na reivindicação e formulação de políticas públicas.

Sérgio Botton Barcellos é faz Doutorado em Sociologia Rural na UFRRJ.

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FONTE BIBLIOGRÁFICA UTILIZADA

MAPA DA VIOLÊNCIA 2012 – CRIANÇAS E ADOLESCENTES DO BRASIL. Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2012/MapaViolencia2012_Criancas_e_Adolescentes.pdf. Publicado: 21 de Julho de 2012.

(1) Estudo disponível no link: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2012/MapaViolencia2012_Criancas_e_Adolescentes.pdf

(2) Para compreender melhor a pesquisa indica-se assistir a entrevista com o autor: http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=2FwQ3dk98WE.

(3) Quando refere-se sobre a necessidade de uma política pública de infraestrutura adequada, não é o caso de grandes projetos de “desenvolvimento”, como a Usina de Belo Monte. Na cidade onde a Usina está se instalando, além da criminalidade crescente, da inflação imobiliária, das desapropriações e dos problemas com saúde e educação, está ocorrendo o aumento dos estupros e da prostituição infantil. Ver mais em: http://www.xinguvivo.org.br/2011/10/11/com-belo-monte-violencia-sexual-contra-crianca-e-adolescente-cresce-138/

 


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