Opinião
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10 de maio de 2012
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13:30

Um mal necessário: redução dos juros passa pela alteração da poupança

Por
Sul 21
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Por Luana P. Betti — Técnica do DIEESE

Nas últimas semanas, foi aplicada uma série de medidas à economia brasileira objetivando estimular a atividade econômica do país, a qual vem apresentando resultados mais modestos influenciados pela crise da internacional. Dentre estas medidas, encontra-se a redução da taxa básica de juros, denominada Taxa SELIC, desde meados de 2011.

Grosso modo, a taxa SELIC é a base para a magnitude das taxas de juros cobradas no mercado para financiamento e para empréstimos. Nesse sentido, ao comprimir a taxa de juros básica da economia, torna-se menor o custo da obtenção do crédito, estimulando os níveis de consumo e de investimento.

Por outro lado, a taxa SELIC é a taxa a qual baliza remuneração dos títulos públicos utilizados para arrecadação de recursos públicos. Dessa forma, quanto maior essa taxa, mais atraente torna-se o investimento em títulos públicos, que, aliado ao rendimento líquido consideravelmente elevado, é um ativo de renda fixa, ou seja, de baixo risco. Contudo, no sentido oposto, quando menor a taxa de juros que remunera esses títulos, ao descontar o imposto de renda e a taxa de administração, esse tipo de investimento torna-se menos vantajoso para o investidor do que a aplicações na poupança, a qual é livre destes custos. E este é o pilar de sustentação das mudanças recentes que ocorreram nas regras do funcionamento da caderneta de poupança.

Com redução de 3,5 p.p desde maio do ano passado, a taxa básica de juros cai de 12% ao ano para os atuais 9,0%, com perspectiva de chegar ao patamar próximo aos 8,0% a.a. Essa trajetória de redução nos juros poderia implicar na fuga de investimentos dos títulos públicos para a poupança, a qual, por não apresentar taxas de administração e ser livre de impostos (IR e IOF), tornar-se-ia mais rentável aos níveis mais baixos de juros. Ao nível de juros atuais, a rentabilidade da poupança de 6,17% a.a acrescidos da TR já supera metade dos fundos de renda fixa disponíveis para todos os investidores e, dessa forma se a queda dos juros se acentuar, a vantagem comparativa aumenta. Com a redução de investimentos em títulos públicos, torna-se menor a capacidade de financiamento público. Portanto, a poupança nos moldes atuais impunha travas para maiores reduções na SELIC. Por este motivo, para possibilitar a redução e a manutenção desta, foram anunciadas mudanças nas regras de funcionamento da poupança.

A nova regra de remuneração da caderneta de poupança adotada pelo governo federal coloca a taxa SELIC como seu indexador, vigorando para as novas contas e para os novos depósitos em contas antigas. A alteração ocorre a partir do momento em que a taxa SELIC atingir o percentual de 8,5% ou menos, a remuneração passará corresponder a 70% da taxa SELIC somada à variação da Taxa Referencial (TR). Enquanto a taxa SELIC permanecer acima de 8,5% ao ano, estará em vigor a regra antiga – correção de 6,17% mais variação da TR. O objetivo principal desta alteração é manter os investimentos que são atrelados à taxa de juros básica SELIC tenham retornos superiores em relação aos da poupança. Ainda, essa nova regra aproxima-se das regras de vários outros países, em que a taxa de reajuste das poupanças são variáveis conforme uma composição que leva em conta basicamente a taxa de juros do país, tempo de permanência e valores, entre outros fatores.

Com essas mudanças, a pergunta que se impõe é: quais as implicações para os pequenos investidores, público alvo da poupança?

O rendimento da poupança será relativamente menor em relação à regra antiga. Fazendo uma simulação simples de um único depósito de R$ 100,00 na poupança, considerando o rendimento atual de 6,17% acrescido da TR de 0,27% (percentual de abril de 2012), ao final de um ano o montante obtido seria de R$ 106,46, um rendimento de 6,46% (Gráfico 1). Com a taxa SELIC em 8,5%, o percentual de rendimento da poupança cai para 6,24% a.a, totalizando um valor final de R$ 106,24. No cenário de juros ainda menores, no patamar de 8,0%, o montante chega a R$ 105,89. Assim, as perdas de reajuste entre a regra antiga e a nova regra de correção da poupança são crescentes a partir do momento que a taxa de juros SELIC atinge 8,5%, podendo chegar a menos 2,32% caso a taxa chegue a improváveis 5,5% ao ano.

Apesar desta redução relativa nos rendimentos dos novos depósitos na poupança, deve-se considerar que com altos níveis de taxas de juros, os títulos de renda fixa atrelados a taxa SELIC deslocavam o dinheiro disponível do investimento produtivo (ou seja, criação de um nova empresa, fábrica, etc.) em que o retorno é incerto para investimentos no mercado financeiro em títulos de baixo risco, o qual o retorno é certo. Um exemplo simples, considerando a taxa de juros de 9,0% e uma inflação média de 4,5%, um investimento em título público atingiria ganho real em torno de 4,3% livres de risco. Por outro lado, se o investidor fosse investir no mercado produtivo, por exemplo uma fábrica industrial, o retorno deve ser maior do que 4,3% para o investimento nesta indústria ser atrativo. Ao reduzir-se a taxa de juros, cria-se incentivos para que o investidor aloque seus recursos no setor produtivo no qual são gerados empregos e renda, os quais são motores da atividade econômica.

Dessa forma, a alteração da regra de reajuste da poupança deve ser vista como um ônus que faz parte de um processo maior, cujo objetivo é a redução das taxas de juros do país, que, em termos reais, ainda é uma das mais altas do mundo.


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