Política
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20 de maio de 2015
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17:11

Brasil e China: a necessidade de investir na parceria sem se tornar ‘colônia econômica’

Por
Sul 21
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Luiza Bulhões Olmedo

Dilma Rousseff e Li Keqiang em Brasília | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Dilma Rousseff e Li Keqiang em Brasília | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Na terça-feira (19), a presidente Dilma Rousseff recebeu a visita do primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, que realiza uma viagem pela América Latina. Li, acompanhado pela mulher e por uma delegação com 150 empresários chineses, ficará no continente até o dia 26, e se reunirá ainda com os presidentes da Colômbia, do México e do Chile.

No Brasil, foram assinados uma série de acordos, em diferentes áreas. Segundo o subsecretário-geral de Política do ministério das Relações Exteriores, embaixador José Graça Lima, esses acordos devem implicar em mais de US$ 50 bilhões de investimento chinês no Brasil. Os projetos deverão focar-se na cooperação industrial e tecnológica, em infraestrutura e energia, na formação de recursos humanos e em apoio financeiro.

Um dos principais projetos discutidos no encontro deste ano foi uma ligação ferroviária de 3.500 quilômetros, que conecte o porto de Santos, no Oceano Atlântico, ao porto peruano de Ilo, no Oceano Pacífico. A construção dessa obra de infraestrutura facilitará o escoamento da produção agrícola e mineral brasileira para a Ásia, sem que seja necessária a passagem pelo Canal do Panamá.

Outra medida que deve favorecer o agronegócio brasileiro é a liberação de exportações de carne bovina do Brasil para a China. Um embargo imposto em 2012 já foi derrubado no ano passado, mas o protocolo sanitário deverá ser assinado nesta visita, e possibilitará a operacionalização das exportações bovinas.

A indústria aeronáutica também deverá beneficiar-se da visita dos chineses. Um acordo de US$ 1,3 bilhão já foi assinado entre o BNDES e a China para a exportação de 40 aviões E-195 da Embraer.

A demanda por commodities

Campo de soja | Foto: Camila Domingues/ Palácio Piratini
Campo de soja | Foto: Camila Domingues/ Palácio Piratini

A relação da China com a América Latina começou a ganhar nova dinâmica a partir das reformas econômicas capitalistas desenvolvidas por Den Xiao Ping, iniciadas em 1979. Essas transformações chinesas levaram o país de uma sociedade agrária para a segunda maior economia do mundo, em menos de duas décadas.

O crescimento chinês, somado ao fim da Guerra Fria e o desinteresse estadunidense na América Latina, propiciaram uma forte aproximação da China com a região. A ascensão econômica do gigante asiático representou uma oportunidade de desenvolvimento para os países em desenvolvimento.  Os mais beneficiados foram os produtores de commodities, como petróleo, minerais e alimentos, as quais a China passou a demandar cada vez mais, excedendo a sua capacidade de produção interna.

Nesse contexto é que tem evoluído a relação entre Brasil e China. Os vínculos econômicos entre os dois países foram se aprofundando desde 1974, quando as relações diplomáticas foram estabelecidas. O intercâmbio se intensificou especialmente com o boom de commodities entre 2003 e 2008, que representou o aumento dos preços da soja e do minério de ferro que o Brasil vende para a China. Em 2009 o país tornou-se o principal parceiro comercial do Brasil, e uma das suas principais fontes de investimento.

Apesar das vantagens imediatas de atrelar-se ao crescimento chinês, a oportunidade vem acompanhada de uma armadilha: a desindustrialização da pauta de exportações brasileiras, que está cada vez mais reduzida a produtos agrícolas, enquanto a China aumenta o valor agregado de seus produtos, cada vez mais sofisticados tecnologicamente.

Em 2013, entre os 10 principais produtos brasileiros exportados para a China, não havia nenhum produto manufaturado. As exportações constituíam-se basicamente em petróleo, soja e minério de ferro. Já em relação às exportações da China para o Brasil, todos os 10 principais produtos eram manufaturados, encabeçados por aparelhos televisivos, telefônicos e eletrônicos.

Com base nesses dados, alguns estudiosos chegam a afirmar que o Brasil estaria se tornando uma colônia econômica chinesa, o que se aproximaria à experiência de dependência que estabelecemos com EUA durante o século XX. A crise internacional de 2008 e a consequente queda no preço das commodities afetaram severamente a balança comercial brasileira, sinalizando que a concentração da pauta de exportação em poucos produtos primários realmente não é sustentável para a economia do país.

Vantagens

Líderes estão reunidos em Fortaleza| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Líderes estão reunidos em Fortaleza| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Entretanto, a relação com a China pode ir muito além das exportações agrícolas. É impossível dissociar as relações bilaterais entre Brasil e China do âmbito internacional, em que ambos os países, guardadas as assimetrias, são vistos como potências emergentes em uma nova ordem internacional. O fórum BRICS (Brasil, China, Índia e África do Sul) é o principal reflexo da associação entre os países de maior peso político e econômico do chamado “Sul Global”. E a consolidação do Banco de Desenvolvimento dos BRICS, no ano passado, que ampliará os canais de obtenção de fundos para projetos de desenvolvimento, indica a relevância dessa coalizão.

Ou seja, a ascensão chinesa, fora dos centros tradicionais do capitalismo (EUA, Europa e Japão) representa uma oportunidade de parceria “sul-sul”. Dados os interesses internacionais convergentes, as relações entre Brasil e China têm potencial de ganhos mútuos que devem ser explorados. Os capitais chineses, se bem direcionados, podem render benefícios para ambos os países, como se vê na parceria no setor aeronáutico.

Para que a relação entre os países seja mais balanceada, o Brasil deve implementar uma estratégia pragmática, visando a diversificação da pauta de exportações para a China. É preciso investir no conhecimento sobre o país, seu mercado consumidor e suas necessidades, para que o empresariado brasileiro possa explorar as vantagens do intercâmbio com a China. Somente desta forma investimentos tão importantes como a ferrovia que ligará o Atlântico ao Pacífico, não serão apenas portas de entrada de produtos manufaturados chineses e de saída de produtos agrícolas brasileiros.


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