A tarde chuvosa desta quarta-feira (23) em Porto Alegre não arrefeceu o ânimo dos indígenas que se concentraram na Esquina Democrática, no centro da cidade, para protestar contra o Marco Temporal e exigir justiça pelos assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Philips. Formado por indígenas das etnias Kaingang, Mbya Guarani, Charrua e Xokleng, o grupo com muitas crianças e adolescentes percorreu parte da Rua dos Andradas entoando frases como “O Brasil é nosso”, “Demarcação já”, “Fora Bolsonaro” e cânticos tradicionais.
Por cerca de 1h, os indígenas criticaram a atual direção da Fundação Nacional do Índio (Funai) e o governo de Jair Bolsonaro (PL), acusado-os de agir contra os direitos dos povos originários. Durante a semana, manifestações semelhantes ocorreram em outras capitais do País, reunindo também servidores da Funai insatisfeitos com a política conduzida pelo atual presidente do órgão, Marcelo Augusto Xavier da Silva.
“Hoje a Funai está nas mãos do outro lado e nós não aceitamos isso. O Brasil, antes de tudo, é terra indígena”, afirmou Woi Xokleng, estudante da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e membro do Coletivo Indígena na Universidade.
“Podem derrubar Bruno, podem derrubar Dom, podem derrubar nossas lideranças, mas continuamos de pé. Somos sementes. A nossa luta não vai parar, vamos lutar até o último guerreiro”, enfatizou Woi.
O representante do povo Guarani criticou o Marco Temporal, entendimento que busca limitar a demarcação de territórios indígenas àqueles que estavam ocupados na ocasião da promulgação da Constituição, em 1988. A tese está em análise no Supremo Tribunal Federal (STF), com o julgamento atualmente suspenso.
“Esse Marco, pra nós, não vai existir, vai servir só pro invasor, mas pra nós, nunca vai existir. Estamos aqui desde antes de 1.500”, declarou Hélio Guarani.
“Falam em ‘pátria amada’, mas não vemos isso. Nós somos pátria amada, defendendo a água e a natureza”, afirmou o representante Guarani, lembrando que o solo usado pelo agronegócio é “adubado” com sangue indígena. “Não vamos aceitar esse ataque aos nossos direitos e nossas vidas.”
Numa fala emocionada, Volmir Vergueiro, cacique da aldeia no Morro do Osso, na Capital, destacou que os assassinatos agora não se restringem aos indígenas, e estão vitimando também não-indígenas que defendem os direitos dos povos originários, como Bruno Pereira e o jornalista inglês Dom Philips.
“O que será das nossas crianças se o Marco Temporal for aprovado? Quanto sangue já foi derramado de nossos parentes? Não podemos deixar assim. Chega de genocídio, chega!”, exclamou o cacique.
A liderança da aldeia no Morro do Osso pediu para as pessoas presentes no centro de Porto Alegre perceberem que a luta indígena é pela preservação da natureza e, dessa forma, favorece toda a humanidade.
“Onde tem indígena sempre tem verde, sempre tem uma fonte de água. Estamos lutando pelos não-índios também. Hoje não temos mais caça, não temos mais peixe. Vamos juntos lutar pela melhoria desse planeta. Hoje nem o verão e nem o inverno é mais como era antes, está tudo descontrolado no nosso planeta”, destacou o cacique.
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