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24 de maio de 2022
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16:42

Justiça bloqueia bens de família que manteve por 40 anos trabalhadora em situação de escravidão

Por
Sul 21
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Segundo a Superintendência Regional do Trabalho no RS, o caso em Campo Bom foi o primeiro de uma pessoa em condições análogas à escravidão em trabalho doméstico. Foto: Divulgação/Sefaz
Segundo a Superintendência Regional do Trabalho no RS, o caso em Campo Bom foi o primeiro de uma pessoa em condições análogas à escravidão em trabalho doméstico. Foto: Divulgação/Sefaz

O Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT/RS) obteve na Justiça bloqueio parcial de bens e valores monetários dos integrantes de uma família que mantinha, há mais de 40 anos em sua residência em Campo Bom, uma mulher de 54 anos em situação análoga à escravidão. A trabalhadora foi resgatada no começo de fevereiro em operação conjunta realizada por auditores-fiscais do Trabalho da Superintendência Regional do Trabalho, Ministério Público do Trabalho, Polícia Rodoviária Federal e Secretaria de Assistência Social.

Na ação, o MPT/RS calcula em R$ 833.432,28 o valor devido pelos empregadores à resgatada. O valor é referente a 40 anos de realização de trabalhos domésticos sem a devida remuneração.

Para garantir o pagamento das verbas trabalhistas e indenizações por dano moral individual, existencial e coletivo, a ação solicitou, em caráter de tutela provisória de urgência antecipada, o arresto do bem imóvel, assim como a indisponibilidade de todos os bens móveis e imóveis, veículos e ativos depositados junto a instituições financeiras em nome dos empregadores.

A juíza do trabalho da 3ª Vara do Trabalho de Sapiranga, Adriana Freires, aceitou o pedido parcialmente, determinando a inclusão de restrições ao patrimônio dos réus, além do bloqueio de valores financeiros nas contas dos réus que ultrapassem R$ 3 mil.

O MPT também pediu o pagamento de uma pensão mensal no valor de um salário-mínimo à doméstica resgatada. A ação solicita, ainda, a condenação dos empregadores ao cumprimento de obrigações referentes a duração da jornada de trabalho do empregado doméstico; concessão de férias; pagamento de salário e do 13º salário, assim como o depósito do FGTS, entre outras medidas. A ação pede também a penalização com multa na hipótese de qualquer infringência às obrigações solicitadas. A juíza decidiu apreciar esse pedido após o prazo para apresentação de defesa dos réus. A primeira audiência do caso está marcada para o dia 8 de junho.

Por fim, o MPT requereu o pagamento de indenização por dano existencial e dano moral individual em valor não inferior a R$ 400 mil, e outra por dano moral coletivo devido à sociedade em valor não inferior a R$ 200 mil.

O caso teve início após denúncia realizada em novembro de 2021. Após investigação realizada pela assistência social do município e pelos auditores-fiscais do trabalho, a Justiça autorizou uma operação de fiscalização na residência, na qual o resgate foi realizado.

A mulher, de 54 anos, com deficiência intelectual, residia e trabalhava como doméstica desde a infância na casa, sem vínculo de emprego reconhecido durante a maior parte desse tempo. Após o resgate, ela relatou que realizava as atividades de manutenção doméstica da residência numa jornada de trabalho sem limite de tempo diário ou semanal. Contou também que era impedida de sair da residência sozinha ou sem autorização da empregadora, e de conversar ou se relacionar com pessoas estranhas ao núcleo familiar da empregadora, que mantinha os documentos da mulher em sua posse.

Além disso, a resgatada também disse sofrer tratamento desumano e agressões físicas e morais. Depoimentos de vizinhos dos empregadores corroboraram a situação exposta pela empregada.

De acordo com a Superintendência Regional do Trabalho no RS, foi o primeiro caso registrado no estado de resgate de uma pessoa mantida em condições análogas à escravidão em trabalho doméstico. Após o resgate, ao longo de duas audiências, o MPT/RS propôs à família empregadora a assinatura de um Termo de Ajuste de Conduta, proposta rechaçada porque os empregadores alegam não existir vínculo empregatício entre eles e a resgatada.


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