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14 de março de 2017
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22:20

Sob contestação, Dmae afirma que água da Capital é potável: ‘desagradável, mas não imprópria’

Por
Sul 21
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Comissão debateu assuntos referentes a água de Porto Alegre. (Foto: Josiele Silva/CMPA)

Giovana Fleck

Em reunião convocada pela Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh) nesta terça-feira (14), vereadores, representantes do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) e membros do movimento ambientalista debateram o tema “O que há com a água do Dmae?”. Desde a metade de fevereiro de 2017, reclamações vêm sendo registradas tanto nas redes sociais quanto em ouvidorias públicas sobre gosto e cheiro terrosos da água filtrada. Ainda não há total certeza sobre qual substância está interferindo o consumo direto, porém, o Dmae afirma que a água em circulação é potável.

“Por mais desagradável que seja, a água em Porto Alegre não é imprópria para o consumo”, afirmou o membro da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES) Sidnei Agra, em referência ao episódio do ano anterior. Em 2016, o Dmae constatou nível de contaminação 8 na rede de distribuição de águas da Capital, o que configura presença de substâncias químicas no líquido. A transmissão das impurezas foi atribuída à empresa Cettraliq – especializada no tratamento de efluentes industriais de 1,5 mil clientes, entre metalúrgicas, fábricas e universidades.

Advogado da Cettraliq Matheus Fernandes de Jesus declarou que o episódio “não será um caso isolado”. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

“A contaminação das águas de Porto Alegre não começou com o episódio da Centtraliq e, também, não terminará com a Centtraliq”, declarou Matheus Fernandes de Jesus, advogado da empresa presente na reunião. Alguns espectadores riram. Contribuindo com o lado ambientalista da discussão, o presidente do Conselho Municipal de Defesa do Consumidor (Condecon), Claudio Ferreira indagou que “desconhecemos as substâncias específicas que contaminam a água agora e que contaminaram em outros tempos. Sendo assim, como se pode afirmar que é seguro?”. O questionamento de Ferreira levou a discussão para um outro lado. Talvez, o grande problema sejam os padrões de análise da água.

O “mundo real” e o “mundo ideal”

Segundo o Dmae, seus técnicos obedecem os 102 parâmetros da Portaria 2914 para avaliar a potabilidade da água. Além disso, devido à tendência que o Lago (em breve, Rio) Guaíba tem de hospedar a floração de microrganismos que anulam o tratamento inicial, o Dmae se especializou em processo que utiliza química mais robusta em sua barreira sanitária. “Com o verão cada vez mais quente e com menos chuvas, a tendência de proliferação desses organismos cresce muito no Guaíba”, disse o engenheiro químico do Dmae, Marcelo Faccin.

Assim, Faccin descreve que a “saborização da água” faria parte de um processo natural. Ele ilustra com as mãos uma escala em que a água do Dmae pré floração estaria em um nível muito elevado, caindo alguns pontos ao apresentar gosto de terra – mas, ainda assim, se mantendo no padrão de segurança determinado pelo Ministério da Saúde.

De acordo com o engenheiro, haveria tecnologia e mão de obra para manter a água em um padrão estável durante o ano todo, porém, isso geraria um custo muito elevado. “Há uma diferença entre o mundo real e o ideal: no mundo ideal, a água é insípida, inodora e incolor; no mundo real, a água está ambientalmente degradada e, quando potável, atende aos padrões impostos pela legislação”, especifica.

Logo, como Faccin sugere, os padrões de segurança nem sempre requerem que a água siga as recomendações ensinadas no ensino básico. Ou seja, a legislação não requer que ela seja insípida, inodora e incolor. “Tem gosto? Há risco”, afirma o engenheiro da Centtraliq. “Menosprezar os sentidos é menosprezar o consumidor”, concluiu.

Tema central do debate, a água consumida na reunião era mineral e gaseificada. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

Kátia Vanconcellos, presidente da ONG Amigos da Terra Brasil, questionou que a falta de ações imediatas do Dmae pode “acostumar as pessoas” à água com baixa qualidade. “A cada ano acontece uma mudança diferente e parece que só esperar é a solução, mas não deveria ser assim”. Ao que Faccin respondeu: “Se houvesse risco, Porto Alegre estaria sofrendo surtos de gastroenterites, o que não é o caso”. Mas e os efeitos a longo prazo? Faccin deu um gole na água mineral gaseificada oferecida pela Câmara Municipal. “Análises foram enviadas para um laboratório de São Paulo e estamos aguardando as informações para ter certeza do que está acontecendo com a água na Capital e suas consequências”. O relatório final deverá esclarecer se há presença de geosmina, um composto químico que pode gosto e cheiro de mofo ou terra.


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