Política
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25 de julho de 2014
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22:06

Marcha das mulheres negras espera reunir 100 mil manifestantes em 2015 em Brasília

Por
Sul 21
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Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
Encontro nesta sexta-feira marcou o início da mobilização para a marcha, que ocorre em 13 de maio|Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Caio Venâncio

Taxa de mortalidade materna que não cai no mesmo ritmo dos números das mulheres brancas, casos de violência contra a mulher que não são apurados, uma inserção no mercado de trabalho ainda muito vinculada aos serviços domésticos, demora nos processos de nomeação de territórios quilombolas. Estas demandas e problemas estarão presentes na Marcha das Mulheres Negras, que ocorrerá em Brasília, em 13 de maio de 2015, com a expectativa de congregar cerca de 100 mil militantes da luta contra o racismo. O objetivo da ação é cobrar a consolidação das políticas públicas voltadas ao povo negro que foram conquistadas ao longo dos últimos anos.

Nesta sexta-feira (25) pela manhã, quando se comemora o Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, evento no Centro de Referência do Negro, em Porto Alegre, marcou o início das atividades de mobilização. Dezenas de mulheres negras, muitas delas representantes de organizações e entidades vinculadas à questão, compareceram. No Rio Grande do Sul, a Associação Cultural de Mulheres Negras (ACMUN) e a organização de mulheres Maria Mulher coordenam o movimento.

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
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Bolsa Família

Coordenadora da Organização Não-Governamental (ONG) Criola e integrante da Articulação de ONGs de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB), a assistente social Lúcia Xavier deu início ao debate justificando a existência da marcha. Para Lúcia, um avanço já foi conquistado: a implantação, nos últimos anos, de políticas públicas voltadas à população negra. Porém, agora é o momento de fazer com que isto chegue a todos. “Já temos conselhos, leis e mecanismos dentro do Estado, agora queremos mostrar tudo isso e seguir com nossas pautas de reivindicação junto à sociedade como um todo”, expôs.

Segundo Lúcia, na última década, dois grandes grupos sociais foram especialmente beneficiados pelas políticas públicas. O primeiro seriam os empresários brancos, agraciados por meio de financiamentos e linhas de crédito de alto valor. O segundo, as mulheres negras, que em grande parte tiveram acesso ao programa Bolsa Família e totalizam 49 milhões de pessoas no país. “Acho que todas aqui temos críticas, mas, diante da fome, da miséria e da morte, ele (Bolsa Família) é quase um milagre. Sabemos o que esse investimento significa pra cada família”, acredita. Entretanto, a ativista que já integrou o Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial vê nisso um investimento desigual do governo, que privilegiaria um setor já abastado.

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
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Para Lúcia, em pleno ano de 2014, ainda existem muitos elementos na estrutura social do país que remontam a um regime escravocrata e patriarcal. A situação das empregadas domésticas, ocupação de boa parte das mulheres negras ainda hoje, seria um exemplo. “Infelizmente, ainda agora, mulher negra e doméstica são quase sinônimos. Só a conquista de direitos dessas pessoas, que apenas recentemente passaram a ser vistas como trabalhadoras que de fato são, consegue distanciá-las da imagem preconceituosa das antigas mucamas que ainda existe por aí”, indicou.

Lei Áurea

Segunda vice-presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindijors), que é apoiador da marcha, e integrante do Núcleo de Jornalistas Afro-brasileiros da entidade, Vera Daisy Barcellos justifica a escolha do dia da marcha em 13 de maio de 2015, quando se lembra da assinatura da Lei Áurea, que marcou o fim da escravidão no Brasil. A data é questionada por setores do movimento negro há mais de 30 anos, mas, conforme a jornalista, estaria recebendo novo significado. “É algo controverso, sim, pois os negros foram libertos numa situação de total desamparo, sem qualquer política de habitação, emprego, educação. Agora, estamos fazendo dessa oportunidade um momento para lembrar a luta contra o racismo, é o Dia Nacional de Denúncia contra o Racismo”, argumenta.

Embora o protagonismo e a direção política da marcha caiba às mulheres negras, Vera Daisy, que milita pelo tema há quase 50 anos, ressalta que a mobilização vai ser aberta aos parceiros da causa, sejam eles homens negros, brancos ou mulheres brancas. “Nossas pautas vão ao encontro daquilo que é defendido pelo movimento feminista como um todo, mas tem especificidades”, esclarece.

A marcha foi idealizada em 2011, num encontro nacional de mulheres negras. Inicialmente, se chamaria “Marcha das 100 mil Mulheres Negras”, mas o nome foi alterado para não haver frustração caso a meta não fosse atingida.

Integrante da ACMUN, a psicóloga Simone Cruz explica que os recursos para levar o maior número possível de militantes à capital federal terão diferentes origens. “Estamos fazendo um almoço para arrecadar fundos. Novas atividades deste tipo ocorrerão. Também contamos com o apoio de sindicatos”, detalha. A marcha ocorre em Brasília “por uma questão simbólica”, mas outras ações estão previstas em Porto Alegre. Simone sinaliza que um ato não é descartado e a meta é dialogar com as negras que ainda não estão inseridas em qualquer tipo de movimento ou entidade. Em tempo de campanha eleitoral, um debate entre as diferentes candidatas negras é cogitado. “É aquilo: ninguém melhor do que nós mesmas pra falar sobre racismo e saber como se posicionar diante dele”, defendeu.

 


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