Opinião
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17 de setembro de 2021
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10:53

Sobre coisas inacreditáveis ou a CEITEC, mais uma vez (por Miguel Rossetto)

 TCU suspendeu liquidação do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec) em setembro de 2021 | (Divulgação)
TCU suspendeu liquidação do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec) em setembro de 2021 | (Divulgação)

Miguel Rossetto (*)

O contexto: A economia capitalista mundial avança por uma economia digital, na qual Estados Nacionais e grandes corporações investem enormes recursos em ciência e pesquisa para dominarem todo o ciclo tecnológico e produtivo. O Brasil em 2001 lança o PNM – Programa Nacional de Microeletrônica – e, em 2005, o Programa CI Brasil, com o objetivo de inserir o país no cenário internacional de semicondutores. Em 2008, é criada a empresa CEITEC (Centro Nacional de Tecnologia Avançada S.A.), como parte deste programa estratégico de alta tecnologia e, em 2012, a fábrica começa a operar e inicia sua curva de aprendizado.   

O absurdo: No dia 15 de dezembro de 2020, decreto de Bolsonaro determina a dissolução da CEITEC, pretendendo liquidar a primeira e única fábrica do Brasil de semicondutores (chips), componente fundamental para a indústria de microeletrônica e base para economia do século XXI. Todos os grandes países investem pesadamente nestas tecnologias e na capacidade própria de produção. A CEITEC, localizada em Porto Alegre, possui 46 patentes nacionais e internacionais, profissionais altamente qualificados, está em operação e preparada para atender fatia importante do mercado nacional de semicondutores. É parte de um projeto para o desenvolvimento da microeletrônica nacional. No momento em que a empresa se prepara para se autofinanciar, não depender de recursos orçamentários, o governo federal, de forma enlouquecida, quer queimar R$ 800 milhões investidos, destruir  um capital intelectual construído e capaz de operar a única fábrica de semicondutores do país. Sua liquidação é, portanto, um crime contra o Brasil, já denunciado por várias vezes.

A boa noticia é que o TCU enxergou esse escândalo, esta ilegalidade e interrompeu a liquidação da CEITEC.

A lucidez responsável: Agora, no dia 1 de setembro de 2021, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou ao Ministério da Economia a interrupção do processo de liquidação da CEITEC.  Deu prazo de 60 dias para o Ministério explicar um conjunto de questões. Segundo o TCU, “os motivos que conduziram à liquidação da CEITEC não se sustentam, carecendo de maior fundamentação, pois se apoiaram em análises que não ponderaram relevantes perdas e dispêndios de recursos públicos como consequências imediatas desta linha de ação”. Mais ainda, “o Ministério da Economia deve enviar ao Tribunal informações que demonstrem o atendimento do interesse público para promover a liquidação da empresa, considerando sua posição estratégica na produção nacional de semicondutores e o capital intelectual constituído pela CEITEC”.

A liquidação da CEITEC está suspensa.

O inacreditável: No dia 10 de setembro, em entrevista ao jornal O Globo, o ministro de Relações Exteriores, Carlos França, em nome do governo federal, anuncia que frente à crise de abastecimento de semicondutores que está paralisando setores industriais, como o automobilístico, o governo estuda medidas para atrair fábricas estrangeiras para a produção de semicondutores no Brasil – com apoio financeiro e fiscal do governo brasileiro!!! Caro ministro, o Brasil possui uma fábrica de semicondutores, ela se chama CEITEC e está sendo liquidada pelo seu presidente!

A resistência: Cresce a resistência a esta loucura. Nesta semana  participei de reunião com os senadores e senadora do PT, onde foi possível atualizar a situação. A bancada está empenhada na defesa da CEITEC e apresentou o PDL 558 para anular o decreto liquidador de Bolsonaro. Senado e Câmara podem anular decretos presidenciais. O que é inexplicável é o acovardado silêncio cúmplice de Leite e de Melo diante desta enorme perda para Porto Alegre e o Rio Grande do Sul.

A fábrica está em operação, produzindo. É possível recompor o quadro de profissionais demitidos, reorganizar o plano operacional e de negócios da empresa para que ela possa atender as necessidades urgentes da indústria brasileira e retomar um plano nacional para o desenvolvimento da microeletrônica no país. Todos nós sabemos que não se trata só de uma fábrica, mas de um outro futuro. Ainda é tempo!

(*) Miguel Rossetto foi vice-governador do Rio Grande do Sul, depurado federal e ministro de Estado nos governos Lula e Dilma

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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