Opinião
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21 de julho de 2021
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13:49

Semipresidencialismo: uma discussão equivocada (por Augusto N. C. de Oliveira)

'Apoio no Parlamento significa partidos e coalizões de partidos'.
(Foto: Agência Câmara)
'Apoio no Parlamento significa partidos e coalizões de partidos'. (Foto: Agência Câmara)

Augusto Neftali Corte de Oliveira (*)

O Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e Presidente do Superior Tribunal Eleitoral (STE), Luís Roberto Barroso, propôs recentemente a adoção do sistema de governo semipresidencialista no Brasil. A proposta também foi endossada pelo Ministro do STF Gilmar Mendes e pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira.

Em sua fala, o Ministro Barroso rascunhou o seguinte: (a) um Presidente escolhido em eleições diretas, que indica o primeiro-ministro; (b) a necessidade de aprovação da indicação do primeiro-ministro pelo Congresso Nacional; (c) a possibilidade de remoção do primeiro-ministro por falta de sustentação política.

No semipresidencialismo o primeiro-ministro governa, restando poucos poderes nas mãos do Presidente. Nas palavras do Ministro Barroso, a mudança aumentaria a estabilidade política pois admite a troca do primeiro-ministro durante o mandato presidencial e retiraria o presidente do “varejo político”, a política do dia a dia. Estas suposições não se sustentam.

Um sistema em que o governo (primeiro-ministro) depende de apoio parlamentar será menos estável do que um com separação de poderes e mandato presidencial fixo. Apoio no Parlamento significa partidos e coalizões de partidos. Imagine o custo de manter uma base parlamentar unida se a deserção de um pequeno partido ou grupo puder causar a destituição do governo, sobretudo na fragmentação partidária do Brasil atual. A força do “toma lá, dá cá” só poderá ser muito maior, bem como o impacto de crises sobre o funcionamento do sistema político seria ainda mais agudo.

Também é falso que o semipresidencialismo remova o Presidente do “varejo político”. Em um país grande como o Brasil, parte da legitimidade do Presidente decorre de ele ser o único político eleito pelo país como um todo. No semipresidencialismo, o Presidente tenderia a fazer valer seu poder no dia a dia se sobrepondo ao primeiro-ministro, acentuando situações de conflito entre Presidente e Parlamento.

No semipresidencialismo, uma de três soluções ocorre:

(a)  ou uma forte coalizão de partidos ou um partido majoritário anula o Presidente (caso de Portugal, após uma reforma constitucional que enfraqueceu o Presidente);

(b) ou o Presidente domina politicamente o Parlamento (casos da França, da Polônia e da Rússia);

(c)  ou instala-se crise institucional permanente (casos do Peru recente e da antiga Alemanha, na trágica experiência da República de Weimar).

É compreensível que, neste momento em que vivemos, sejam buscadas alternativas para renovar o sistema político. No entanto, é um erro imaginar que alterações nas regras do jogo irão ser suficientes para responder a problemas cujas causas não estão nestas regras, mas no comportamento de atores e organizações. O semipresidencialismo não é uma solução para os problemas políticos brasileiros.

No Brasil, o semipresidencialismo coroaria a instabilidade política.

(*) Cientista político, professor da Escola de Humanidades da PUCRS (ancolive@gmail.com)

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