Opinião
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30 de novembro de 2012
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13:42

As políticas públicas para a juventude rural: balanço, perspectivas e questões para debate

Por
Sul 21
sul21@sul21.com.br

Por Sérgio Botton Barcellos *

A partir dessa breve exposição de alguns elementos propõe-se provocar o debate sobre as políticas públicas, a questão da juventude rural e as condições de vida no meio rural e os desafios postos para essas questões no próximo ano.

A emergência dos grupos que se reconhecem como juventude rural junto às organizações e movimentos sociais, por meio de reivindicações, processos de mobilização e da representação política, tanto no âmbito governamental, como não-governamental, além de por em evidência esse grupo social e esse debate para o conjunto da sociedade, abriu oportunidades e espaços de atuação política. Cabe destacar que atualmente a questão da juventude no meio rural brasileiro remete à vivência em um espaço socialmente desigual com a falta de acesso a bens e serviços e tensionados de forma geral por questões como a expansão indiscriminada do agronegócio e a perpetuação do latifúndio.

Em referência ao exposto, demograficamente está ocorrendo uma inegável diminuição da porcentagem de jovens e de adultos que vivem nas áreas rurais nas últimas décadas. Há em torno de 51 milhões de jovens entre 15 e 29 anos no Brasil, sendo que 43.280.019 vivem nas cidades e 8.060.454 no meio rural, representando mais de um quarto da população total brasileira. Esses números se somam ao que se chama bônus demográfico, no qual vivemos ainda um período com a maior População Economicamente Ativa (PEA) e a mais jovem da nossa história (IBGE, 2010).

No que tange questões como o êxodo e a sucessão rural no Brasil a população rural no ano 2000 era de 31.835.143 habitantes dos quais cerca de 9 milhões eram de faixa etária jovem. Em 2010 havia 29.830.007 habitantes com 8 milhões de jovens (IBGE, 2010). Contudo, cabe uma discussão mais aprofundada sobre isso em outro momento, pois segundo os dados do PNAD (2011), recentemente divulgados, estimou-se que no ano de 2011 apenas cerca de 7 milhões de pessoas entre 15 a 29 anos estavam residindo no meio rural, sendo a maioria composta por homens. Evidencia-se que cerca de 2 milhões de pessoas deixaram o meio rural nos últimos anos (2000-2010), sendo que cerca de 1 milhão são pessoas em idade considerada jovem, isto é, metade da emigração do campo para a cidade é do grupo social etário considerado jovem.

Segundo o PNAD (2011) das cerca de 8 milhões de famílias que residem no meio rural, 6,5 milhões sobrevivem com até 3 salários mínimos e apenas 147 mil famílias sobrevivem com uma renda de mais de 10 salários mínimos e até mais de 20 salários. Trata-se apenas de um dos demonstrativos da desigualdade social que ainda temos no meio rural brasileiro.

Destaca-se que no Brasil 46% das terras estão em posse de 1% dos proprietários rurais, sendo um dos maiores índices de concentração de terra do mundo. Nesse sentido, ressalta-se que temos um meio rural com 1.363 conflitos por diversos motivos segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Entre esses, destaca-se o aumento dos conflitos protagonizados pelo poder privado – fazendeiros, empresários, madeireiros e outros que são responsáveis por 689 dos conflitos por terra. Ainda, segundo dados da CPT, há cerca de 120 mil famílias reivindicando terra no Brasil.

Diante dessas condições desiguais de vida, em pesquisas recentes, como  OIT (2010)  e do IPEA (2009), há a indicação de que os jovens que vivem no meio rural consideram as oportunidades de trabalho e construção de uma autonomia para a vida como questões difíceis ou pouco viáveis, pois, além de estarem inseridos em padrões culturais que operam com uma lógica quase restrita da continuidade da atividade agrícola, há também a relação disso com o tamanho da terra e a persistência da tutela cultural e política aos padrões familiares e comunitários. Mesmo em meio a essa realidade ainda adversa e da “diáspora moderna” dos povos do campo para as cidades, há muitos grupos políticos em juventude rural que se organizam e querem permanecer no meio rural com direitos sociais e condições de vida dignas, e para isso reivindicam e propõem políticas públicas.

Perspectivas para 2013 e a participação da juventude rural nas políticas públicas

A criação de instituições, políticas e programas com referência específica aos jovens situados no meio urbano e rural prospectam um marco institucional diferenciado no âmbito das relações de acordo e disputa política no Estado brasileiro. Nas últimas duas décadas, pode ser evidenciado que os formuladores de políticas públicas para o meio rural brasileiro têm demonstrado alguma preocupação com a diversidade de grupos sociais (populações quilombolas, extrativistas, pescadores artesanais, indígenas, etc.) presentes neste espaço.

Em meio a essa conjuntura, no âmbito do governo federal – juntamente com os grupos da sociedade civil que participam dos espaços de participação promovidos pelo governo –, ocorreu a constituição de diversos espaços de discussão de ações políticas direcionadas para a juventude rural, como o Grupo e atualmente Comitê Permanente de Juventude Rural (CPJR) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF) e a partir de 2011 o Grupo de Trabalho em Juventude Rural (GTJR) da Secretaria Nacional da Juventude (SNJ). Além desses espaços ocorre no âmbito do governo federal, ações, políticas e programas direcionados para a juventude rural, como o PRONAF-Jovem, o selo Nossa Primeira Terra – PNCF e o PRONATEC.

No âmbito dos governos percebe-se que ocorreram avanços, como a formulação dos Planos ou políticas de Juventude e a constituição dos Conselhos de Juventude. O Plano Nacional de Juventude (PL 4.530, 2004) ainda falta ser aprovado no Congresso Nacional. Outro aspecto a ser considerado foi à participação expressiva, entre os grupos de juventude organizados politicamente, para reivindicar reconhecimento e direitos na  2.ª Conferência Nacional de Juventude.  Também destaca-se a realização do 1.º Seminário Nacional de Juventude Rural e os grupos temáticos criados pela SNJ que estão contando com uma participação destacada de diversos grupos jovens.

Ainda ressalta-se que no ano de 2011 ocorreu a conquista do Programa Autonomia e Emancipação da Juventude no Plano Plurianual do Governo Federal (PPA 2012-2015), contemplando inclusive a Juventude Rural. Contudo, o orçamento de R$ 50 milhões é considerado muito insuficiente diante do conjunto de 143 demandas apresentadas pela juventude rural para a SNJ no Seminário supramencionado. Asim, a SNJ mesmo com a evidente e reconhecida capacidade política e técnica de ação e diálogo com a juventude, ainda está fragilizada pela falta de priorização do tema e pela acirrada disputa interburocrática e política que há no conjunto da coalizão de 21 partidos da base aliada do governo, além do PT.

Mesmo com o importante e considerável avanço que as políticas públicas para a juventude rural recentemente formuladas ou em elaboração representam, evidencia-se que há desafios e questões para serem debatidos e que provavelmente poderão ser entrave ou considerados gargalos para o ano de 2013.

Políticas Públicas com a juventude rural: escuta, ação e compromisso de governo

Em uma dimensão objetiva temos questões como à desigualdade social sistêmica, que diminuiu consideravelmente nos últimos 10 anos, mas ainda está presente a falta de condições estruturais adequadas para uma vida diversa e digna no meio rural brasileiro. Articulada com essa realidade para as/os jovens rurais há ainda a dimensão relativa às incompreensões ao período de vida e as questões postas por isso, fora ser visto como alguém “que poderá vir a ser”, como se já não estivesse sendo sujeito, em uma sociedade que é regida sob um prisma adultizado e classificatório.

O atual governo federal representa uma construção histórica e anos de luta de uma significativa parcela da classe trabalhadora no Brasil e atualmente está sendo protagonista em muitas transformações muito bem avaliadas na vida imediata do povo brasileiro incluindo muitos grupos em juventude. Contudo, não é por isso que não devemos ficar atentos em que medida está se fazendo política para desestabilizar e modificar os aparatos e mecanismos do Estado que historicamente produzem desigualdade e injustiça socioambiental, bem como reforçam os preconceitos intergeracionais, etnoculturais, de gênero e de cor no Brasil. 

Desconfia-se que a juventude não precisa de gestores/as, acadêmicos/as, legisladores/as e tecnoburocratas “iluminados/as” que queiram “tirar da cartola” ou prometer medidas socioeducativas, assistencialistas ou de “inclusão” no mercado de trabalho capitalista para resolver o “problema” das/os “jovens problemas”. Para implementar e executar políticas públicas viáveis e negociadas com a juventude rural necessita-se de diretrizes políticas e atores, inclusive os próprios jovens, comprometidos com o diálogo, as pautas e as experiências que as e os jovens rurais estão construindo em meio a esse processo.

Aponta-se que para viabilizar e capilarizar essas políticas públicas com um arranjo técnico e político apropriado será em grande medida possível, se a mesma for construída com o conjunto das organizações e movimentos sociais que atuam em juventude rural. Nesse sentido, cabe as e os jovens rurais se organizarem para tentar participar, monitorar e propor indicadores sociais as políticas públicas que abrangem a juventude rural como o PRONATEC. Estações da Juventude no meio rural, Participatório e demais políticas faz-se necessário em 2013.

Por exemplo, as organizações e movimentos sociais em juventude rural terão que se debruçar no próximo ano no sentido de iniciar a elaboração de seus próprios indicadores sociais (princípios, diretrizes, meta de público e de regionalização, por exemplo) para as políticas públicas caso quiserem reivindicar dos governos a realização das mesmas com interface em um projeto de desenvolvimento rural que contemple suas pautas históricas.

Está mais do que evidente que muitos grupos de juventude rural têm projetos, experiências e tecnologias sociais inovadoras em seu cotidiano de atuação política e vida na sociedade, em organizações e movimentos sociais, bem com em alguns governos municipais e estaduais. Contudo, em 2013 indica-se que será necessário continuar persistindo em fazer e formular questões diferentes das que temos para ser possível elaborar um projeto de desenvolvimento rural em conjunto com as diversas iniciativas já existentes no seio da juventude rural, da agricultura familiar, camponesa e dos povos e comunidades tradicionais no país.

* Sérgio Botton Barcellos faz Doutorado em Sociologia Rural na UFRRJ

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